terça-feira, 10 de novembro de 2009

Sessão nove.

Só sei ser feliz no passado. Aprendi cedo a cultivar histórias, mais que as viver. Talvez seja a mesma coisa. Ser feliz no ontem estático, ser feliz no hoje fluido. Sempre tinha uma história pra cada coisa que me acontecia na vida. Se eu tropeçava, a menina um dia se distraiu e tropeçou; se eu estava com fome, era uma vez um tigre que aproveitou a hora em que lhe traziam comida para escapar e voltar pra selva. Tinha mais timidez que imaginação aos sete anos, não me culpem pela falta de originalidade. Minha vida é meu tema predileto. Sempre guardei na boca tudo que me interessa dizer. Sou náufraga da minha saliva. 

Quero que me adivinhem por inteiro, mas sou só beiradas quando falo. Sou só beiradas quando sorrio. No meio do caminho, espero encontrar minhas próprias pegadas. Mas nunca estou onde me espero. Acho que nas sarjetas é que nasceu o assobio. O vento atrasado a gente chama de céu, depois do vinho vejo nuvens em desenhos. Minha palma da mão mostra mais passados que futuros. As linhas do rosto me dizem que vou ter uma vida rabiscada. Seria mais calma se escrevesse em arabescos, não desperdiçaria tanto o que sinto no que não sei dizer. 

Acho que os gatos não dormiriam tanto se tivessem uma vida só. Ou talvez vivam mais de tanto dormir. Talvez até sonhem. 

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